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  • Foto do escritorMônica Cyríaco

A literatura me levou pra Cuba!

Atualizado: 22 de dez. de 2022

A literatura me levou pra Cuba. Não fui pra nenhuma brigada de solidariedade, como fez uma amiga, nem pra nenhum congresso educacional, como fizeram outras. Fui de turistona clássica mesmo, daquelas que fica em hotel em vez de ficar em casas de cubanos ( sem nenhum juízo de valor aqui, pfv, embora tenha sérias restrições ao modelo AirBNB ). Mas, como sempre, levei na mala minhas leituras, porque elas me ajudam a olhar e ver , a evitar clichês e a me sentir um pouco mais conectada com o lugar. E vamos combinar que Cuba não é mesmo qualquer lugar. É a ilha do imaginário de muitas pessoas para o bem e para o mal e percebo que há muita desinformação a respeito desse imaginário no Brasil, principalmente depois que um certo grupo chegou ao poder por aqui. É óbvio que não farei nenhum tratado histórico ou sociológico sobre um lugar em que fiquei como turista por apenas dez dias, detesto superficialidades. Também não farei um roteiro turístico, há muitas páginas fazendo isso. Quero contar o que vi, o que senti, o que aprendi, quero te apresentar Leonardo Padura, o talentosíssimo escritor cubano e seu alter ego, o inspetor de polícia Mario Conde, foram eles os meus guias em Havana, cidade apaixonante, complexa, salseira. Minha amiga Márcia Bichara, que viajara pra Cuba no início daquele ano também me deu dicas preciosas sobre hospedagem, lugares para comer, aonde ir e trocamos figurinhas a respeito das atrações cubanas do Netflix ( veja a lista no final do post) .

Fui a Cuba em maio de 2018. Havia dois anos que Obama acenara com uma possível reconciliação com a Ilha, o Papa havia feito as aproximações um ano antes e parecia que o capitalismo desembarcaria no porto de Havana logo, logo. Haveria mudanças. Então comecei a ter muita vontade de conhecer aquele lugar antes de que ele virasse somente mais um destino turístico (sim , eu tenho consciência de que turistas levam as mudanças e até as aceleram, esse é o paradoxo do turismo). Comecei a pesquisar sobre a ilha. Em 2017, a passagem do furacão Irma havia provocado muitos estragos em Havana. A temporada de furacões em Cuba vai de junho a novembro, sendo setembro e outubro os piores meses para ocorrência de tempestades, o que deixa restritas _ entre dezembro e maio, no máximo até julho_ as temporadas de viagens e encarece demais as passagens aéreas. Em Janeiro e Fevereiro, época em que um professor pode viajar, as passagens estavam proibitivas. Aproveitei em Maio a semana de provas que emendava com um fim de semana, consegui bons preços pela Copa Airlines e embarquei na aventura. Com apenas dez dias, ainda haveria uma outra dificuldade, a ansiedade de querer conhecer tudo em poucos dias e a negociação do roteiro com o marido, companheiro de viagem. Ele não queria abrir mão de Varadero e eu não queria abrir mão de Trinidad. Conclusão: não fui a Santa Clara, nem a Pilar del Rio e Santiago de Cuba ficou de fora por estar muito distante ( acho que a sensação de que preciso voltar a alguns lugares vai me acompanhar pra sempre)

Então comecei a viajar na viagem. No Netflix encontrei vários filmes e documentários, mas a joia escondida no catálogo foi a série de 4 capítulos Quatro Estações em Havana, baseada na tetralogia Estações em Havana, do escritor cubano Leonardo Padura. Os livros contam a história do melancólico detetive Mario Conde , leitor apaixonado de Hemingway e que no pré-universitário sonhava em ser escritor. Cada livro ocorre numa estação do emblemático ano de 1989, o que nos permite viver com Mario Conde por um ano em Havana, no bairro Mantilla , na periferia da cidade e passando por todas as suas estações. Durante o ano de 1989, ano da queda do muro de Berlim e das mudanças históricas que afetariam o mundo, e particularmente Cuba, vivemos numa cidade ao lado de um detetive que mete a mão em vespeiros temáticos como corrupção, fraudes, homossexualidade, contrabando. O Instituto pré-universitário La Víbora é o lugar central da narrativa, histórico e afetivo. Ali, nos bancos escolares adolescentes, houve um dia a promessa de um futuro enorme e aberto, a consolidação das amizades para toda a vida e a promessa de que todos os sonhos sonhados juntos, utopicamente, se realizariam.

_ Incrível, Tamara _ diz Conde e sorri. _ Faz quinze anos que não venho a esta casa e está tudo igualzinho./.../ querendo se sentir como quando estava naquela casa cinematográfica, reunido na biblioteca com o pretexto de estudar, e sempre havia refrigerantes, às vezes até bombons, ar condicionado na biblioteca e sonhos em comum,o Magro, o Coelho, o Cuqui, Dulcita, Conde, todos eles algum dia teriam uma casa como esta, quando formos médicos, engenheiros, historiadores, economistas, escritores e essas coisas que iam ser e que nem todos foram. (Passado Perfeito, p. 37)

Seria, portanto, o passado perfeito, acabado, perdido. Todas as personagens em torno do protagonista se conhecem desde o Instituto, mas somos apresentados a eles já na crise de identidade da vida adulta. Conde, aos 35 anos, volta-se melancolicamente a esse "passado perfeito" que contrasta com a realidade complexa e multifacetada de Cuba, 17 anos depois, mas também com suas próprias questões existenciais e a de seus amigos e que, no fundo, todos nós temos: sou quem eu queria ser? era esse o mundo com que sonhava? onde foi que me perdi de mim?

Entre aquelas colunas, naquelas salas de aula, atrás da escadaria e naquela praça ilogicamente batizada de Vermelha_ porque era negra, simplesmente negra, como tudo o que era tocado pela fuligem e graxa do ponto de ônibus tão perto_ a infância chegara ao fim e, embora mal tivessem aprendido algumas operações matemáticas e leis físicas obstinadamente invariáveis, tornaram-se adultos quando começaram a conhecer o sentido da traição e também o da maldade, quando viram surgir os oportunistas e frustrarem-se certos corações puros, quando amaram apaixonadamente e se embriagaram de dor e alegria e quando aprenderam, sobretudo, a existência dessa necessidade invencível que, na falta de nome melhor, se chama amizade. ( Ventos de Quaresma,p.43)

Há muito desencanto, mas uma geração desencantada não é necessariamente patrimônio cubano, não é mesmo? E é exatamente por isso que ao falar de Conde, Leonardo Padura fala de todos nós, ao falar de Havana, fala de todas as cidades. Aliás, a cidade de Havana é quase uma personagem dos livros. O detetive vai do bairro periférico de Mantilla aos bairros ricos, como Vedado e Miramar , onde vivem a burguesia e os dirigentes da máquina estatal. O mar caribenho é o confidente privilegiado para o protagonista desabafar sobre a inevitabilidade do passado e o peso da história. Muitos leitores de Padura dizem que conhecem Havana a partir de seus livros. Era o que eu queria experimentar naqueles dias. Abaixo estão marcados no mapa alguns deslocamentos do protagonista por Havana na obra mencionada.

La Habana


Imagine uma cidade sem engarrafamentos, buzinas e sirenes, sem prédios enormes, sem letreiros de propaganda que piscam sem parar, sem comerciais, sem shoppings centers, sem apelo a compras. Assim é Havana. Ao chegar, nos sentimos imediatamente viajando no tempo, e isso não é clichê. Sem esse tipo de apelo sensorial, sobra atenção para o que importa: é uma cidade linda, vibrante e muito segura.

Já no caminho para o hotel era possível ver a Havana que não sai nos jornais: Largas ruas arborizadas, casas com quintal, comecei a reconhecer a cidade de Leonardo Padura.

Obs: Os links para fotos dos bairros fora do centro turístico estão no fim do post, retirados do site Havana Times, de que gosto muito e de onde tenho muita informação confiável de Cuba.

ARTE EM TODA PARTE

( Paisagem de Havana , René Portocarrero, 1969)

Ficamos hospedados no centenário hotel Sevilla, localizado em Havana Velha, ao lado do Museu da Revolução e do Museu de Belas Artes e a 5 min a pé do Capitólio. O hotel em si já era uma festa, com músicos de todas as idades e estilos musicais se revezando no saguão o dia inteiro e onde tomei um dos melhores mojitos da minha vida!

Essa veia artística em Cuba me impressionou bastante, porque o tempo todo topei com arte na cidade: no saguão e nas ruas, com vozes, violinos e maracas, no salão de ballet repleto de bailarinas em frente à janela do meu quarto, nos cartazes dos Festivais de Cinema de Cuba,aleatoriamente encontrados pela cidade, no contemporâneo projeto da



Fábrica de Arte Cubano (link no fim do post), onde se pode conhecer a cena artística do país. E não poderia esquecer do Museu Nacional de Belas Artes de Cuba, que francamente me surpreendeu: moderno, com um acervo excelente e que é também oficina e escola de arte. Nos slides ao lado estão as fotos desses lugares de cultura : o Capitólio, que hoje funciona como Sede da Academia Cubana de Ciências, o pátio interno do Museu de Belas Artes e o prédio do Ballet Nacional de Cuba, que é uma escola de ballet e ginástica olímpica

Faça uma visita virtual ao Museu de Belas Artes aqui: https://www.youtube.com/watch?v=TM5ORXvHWCY


A VIDA PASSA DEVAGAR

O passeio de carro antigo é quase um tratado sociológico, porque além de percorrer os principais pontos turísticos de Havana ouvindo sobre os monumentos históricos e sobre a história dos bairros ( os bairros ricos, como Miramar e Vedado, o bairro chinês, a Havana Centro, entre outros), levamos altos papos com o motorista que é também um orgulhoso guia turístico e nos apresentou, junto com a cidade, um pouco de sua vida e da dos cubanos em quase duas horas de passeio. Os cubanos são extremamente carismáticos !

Nos slides, o bairro chinês, cuja existência eu desconhecia, o Passeio do Prado, que corta Havana até o Malecón, a fachada do Gran Teatro Nacional de Cuba, a praça Central José Martí, a escola de artes marciais e boxe Kid Chocolate e por último a monumental Praça da Revolução


Outra maravilha é se perder a pé por Havana Velha, pela divertida Calle Obispo, em que se misturam as casas dos moradores, as lojas de artesanato, o comércio de paladares e o casario tão marcante da cidade. É uma rua cheia de ritmos caribenhos e uma verdadeira babel, turistas tomam as ruas, parece festa e é onde também se localiza o Hotel Ambos Mundos, onde Hemingway viveu por 7 anos e escreveu alguns de seus livros.

No link abaixo você pode acompanhar um walking tour virtual pela Calle Obispo. Vale a pena!

Tomamos uns daiquiris na Floridita, uma graça, há até uma estátua do Hemingway, o cara é onipresente!

Dali seguimos para Plaza de la Catedral.

Na volta, passamos pelo Paseo de Martí já anoitecendo, com os edifícios iluminados, lugar lindo! A última foto é a fachada do Grand Teatro de La Habana iluminada.

HISTÓRIA E RESISTÊNCIA

Dedicamos uma manhã ao Museo de la Revolución. O museu está localizado justamente no antigo palácio presidencial ocupado por Fulgêncio Batista, o presidente deposto por Fidel e seus revolucionários, o que coloca em tensão os dois momentos históricos.

O palácio é riquíssimo, tem uma arquitetura em estilo eclético e pretende contar toda a história recente de Cuba, trazendo informações interessantes sobre o processo eleitoral cubano, além de fotografias antigas, recortes de jornais, objetos pessoais dos revolucionários. Até buracos de tiros nas paredes do palácio participam da narrativa .

O processo eleitoral cubano sempre atrai muitas curiosidades. Eles têm um partido único, mas há eleições diretas, veja:

Fora do palácio, no pavihão Granma, estão alguns meios de transporte usados durante o processo revolucionário , como o famoso barco que trouxe os revolucionários do México, um avião americano abatido, além de mísseis e bombas. Muita história.

El Morro, onde fica a fortaleza colonial que já foi usada como base militar e como prisão, hoje é o lugar pra quem quer ver o inigualável pôr do sol da cidade de Havana, âmbar, da cor do rum. Ali também, todas as noites, há a cerimônia do cañonazo das 9, eles soltam um tiro de canhão às 21h para divertir os turistas. Não fui, mas sei que fica bem cheio . Almocei num hostel com a melhor comida que provei em Havana, El Cañonazo de La Havana. A gastronomia em Cuba não é um atrativo, é preciso que se fale. Eu arriscaria pôr a culpa no cruel embargo sofrido pelo país há décadas, embora na narrativa de Estações em Havana, mesmo nos piores dias do período especial, Mario Conde sempre era surpreendido por Josefina, a mãe de seu melhor amigo, com receitas especiais (os livros trazem várias delas), com ingredientes muitas vezes conseguidos no mercado negro. Mas em Cuba , mesmo sabendo que há mercado atacadista próprio para quem trabalha com turismo e mesmo com a multiplicação dos paladares ( restaurantes familiares quase sempre nas casas de cubanos e que se abrem para clientes no almoço e/ou no jantar) eu preciso confessar que foi difícil encontrar uma comida saborosa. Talvez eu não tenha ido aos lugares certos. Os ingredientes frequentes são o milho, a banana frita, frango, carne de porco, um ensopadinho de carne moída, além do nosso clássico feijão preto e arroz, mas senti muita saudade do alho frito no tempero do feijão rs. Eu creio ter sido falha minha não pesquisar os paladares com antecedência, talvez se eu estivesse hospedada numa casa cubana eu poderia ter recebido essas dicas . Por isso, El Cañonazo me surpreendeu. Mas em compensação, a cerveja Bucaneiros é deliciosa, e os mojitos e daiquiris, nem consigo descrever... Lá em El Morro estão também as melhores vistas de Havana e do Malecón.

DIA DAS MÃES

Era véspera do dia das mães em Cuba ( no Brasil também) e havia muitos filhos comprando lembrancinhas pras suas mães pelas ruas, ofertas de presentes que incluíam arranjos de flores, artesanato, balões em formato de coração, compras para o almoço do dia seguinte. No prédio em frente ao hotel, muitas mulheres com olhos vermelhos abraçando seus filhos que certamente fizeram bonitas homenagens pra elas nas oficinas da Escola Nacional de Ballet e ginástica que havia ficava ali. Foi o dia das mães menos capitalista que vivi, sem shoppings, correrias, comerciais a todo momento, nada disso, acreditam?


Pra fechar meus dias de turista em Havana, fui dançar salsa no Buena Vista Social Club. (Mario Conde preferiria ir ao Río Havana Club curtir jazz ou rock, mas eu, como turista, fui curtir salsa e mambo, né?)



O QUE VI

Havana é linda. No entanto, as imagens veiculadas massivamente por inúmeros meios de comunicação há tempos é a da degradação do casario da cidade, como que para comprovar a degradação da cidade e do país. Assolada há décadas por um criminoso embargo econômico e por uma propaganda cruel que dificulta demais a vida dos cubanos, Havana é o centro industrial e comercial de Cuba, é o principal porto do país, possui estaleiros e indústria química, por exemplo. O déficit habitacional em Cuba é um grande problema, embora muito se tenha feito para renovar e construir novas habitações, uma das ações tem sido o aluguel de casas e quartos para turistas. Em 2018, Havana era um enorme canteiro de obras, preparando-se para as comemorações de seus 500 anos , que ocorreria no ano seguinte. Isso não é tarefa fácil, se pensarmos que, além do embargo , a cidade está numa ilha, cortada por maresias e na rota dos furacões, o que renova anualmente a necessidade de novas moradias e de preservação das existentes.

No entanto, ninguém vive na rua, há albergues para famílias sem moradia e há sérias medidas para prevenir a especulação imobiliária na cidade que tem seu centro histórico declarado patrimônio da humanidade desde 1982. Por exemplo, um estrangeiro jamais pode ser proprietário de um imóvel nas áreas turísticas e é proibido a moradores de outras áreas de Cuba migrar para a capital, embora já haja flexibilizações nesses aspectos migratórios. ( no filme Uma escola em Havana esse assunto é discutido)

Toda coisa tem sua beleza, mas nem todos podem vê-la. Confúcio, 535 a.C  

Havana tem quase 50% do déficit habitacional do país e sua centenária arquitetura aparece lado a lado com cortiços semidestruídos pelo clima tropical e pela falta de manutenção, há edifícios em que vivem muitas famílias, algumas amontoadas em um só cômodo, lembram os nossos cortiços. As autoridades transferem para albergues provisórios as pessoas que vivem em edifícios muito deteriorados, até que sejam reformados ou que se possa oferecer a elas uma nova moradia. Problemão!

Tudo se enegrece com o tempo, como a cidade por onde caminho, entre pórticos sujos, depósitos de lixo petrificados, paredes descascadas até o osso. No final somos parecidos, a cidade que me escolheu e eu, o escolhido: morremos um pouco, todo dia, de morte longa e prematura, feita de pequenas feridas. E embora eu queira me rebelar, esta cidade me mantém agarrado pela gola e me domina, com seus derradeiros mistérios. (Ventos de quaresma)

MOEDAS

Normalmente uma diária com café da manhã numa casa cubana custa 30 CUCs_ peso cubano conversível_ que é equivalente a 1 euro=1 CUC, mas o salário mínimo médio mensal em Cuba é de 25 CUCs. As contas e salários dos cubanos é medido em CUPs _ peso cubano_ e a relação entre eles é de 25 Cups para 1 CUC , aproximadamente. Os estrangeiros pagam 1 CUC em algo que os cubanos compram por 1 CUP. Por exemplo, uma entrada de museu custou 6 CUCs pra mim ( 6 euros) e 6 CUPs para um cubano ( 0,24 centavos de euro). É claro que isso causa distorções incríveis em relação a outros setores da economia e também por isso, muitos profissionais têm migrado para o setor turístico, pois qualquer atividade que envolva CUCs pressupõe um ganho real de salários em relação a outros mercados profissionais. Esse é outro problema sobre o qual os economistas da ilha têm se debruçado nesses últimos anos. Peguei táxis dirigidos por advogados e engenheiros, que se trabalhassem para o governo ganhariam entre 30 e 60 euros por mês, por exemplo, mas que conseguem, numa única corrida, ganhar 15 euros. Eles pagam uma diária ao governo, que subsidia seus carros modernos ( de marcas chinesas e coreanas) e ficam com o que sobra.

ALIMENTAÇÃO

Em relação à alimentação, não falta nada para os setores turísticos. Para os cubanos o governo subsidia uma cesta básica por pessoa, o que não é suficiente para a alimentação mensal e o que falta precisa ser complementado. E falta sempre muita coisa num país que sofre embargo. A ilha compra do exterior entre 60 a 70% do que consome e o governo é o único que pode importar alimentos. Esse tipo de situação faz com que muitos cubanos recorram ao que chamam de mercado negro, que funciona assim: se você tem dinheiro, você pode sempre encontrar alimentos pra comprar, mesmo que estejam além de sua cota. Se trabalha numa fábrica de charutos você desvia alguns do Estado pra vender por fora. Isso pode acontecer com ovos, combustíveis, tickets de museu ou fábrica de calçados. São pequenas corrupções que podem causar problemas para o trabalhador, mas quem poderia julgar?

EDUCAÇÃO E SAÚDE

Em relação à educação e saúde, todos os cubanos com quem conversei são muito orgulhosos desses serviços. Os cubanos são muito cultos, frequentemente falam uma outra língua estrangeira, geralmente inglês, os mais velhos falam russo, os trabalhadores dos setores turísticos têm cursos de idiomas gratuitos. O investimento em esportes e cultura é maior que em muitos lugares que já visitei, dá até vontade de rir de brasileiros que criticam Cuba, quando vemos crianças e jovens fazendo ginástica olímpica, lutas ( eles amam boxe), jogando beisebol, dançando ballet. Não há criança de rua. Não há menores nas noites. A violência é baixíssima, o governo tem uma política de drogas de tolerância zero. A tolerância é zero também para assaltos a turistas. Observei que os cubanos são muito conscientes do que acontece dentro e fora da ilha, conhecem outras realidades e , na maior parte das vezes, reconhecem que precisa haver mudanças, mas não querem perder o que já conquistaram. Pra que se tenha ideia, o Campus Universitário é ponto turístico, todas as vezes que passei por um Campus, fui alertada por um cubano.

Na época, ainda havia muitos médicos no Brasil, conhecemos pelo menos três cubanos em locais diferentes que tinham filhos trabalhando aqui.


MÍDIA

A TV de Cuba me surpreendeu positivamente porque, apesar de estatal, está longe de ser um mero suporte de propaganda ideológica, há programas educativos, documentários, filmes estadunidenses, novelas brasileiras, filmes cubanos, informação. E agora na Ilha, há a Internet, restrita ao uso em alguns pontos da cidade, como hotéis, restaurantes, alguns hostels e praças, mas que está se popularizando também no uso doméstico, e isso está mudando as coisas muito rapidamente. Você compra um cartão para acesso , raspa o código, digita esse código na rede de seu celular e usa por até 1 hora por 1 CUC. Lives, nem pensar!

COMO CHEGUEI

Pegamos um voo da Copa Airlines saindo do Galeão de madrugada com conexão no Panamá em direção a Havana. É necessário um visto, que pode ser pago lá mesmo no aeroporto do Panamá e custa 20 dólares, pagos em espécie. O turismo em Cuba é bem caro, para planejamento, faça sempre cotações em euro e saiba que não irá se locomover facilmente, portanto haverá um gasto maior com transporte.

Semana passada , aquele ser laranja que vive na casa branca proibiu qualquer aeronave estadunidense de sair ou chegar a Cuba, o que sem dúvida vai prejudicar mais ainda o turismo. Nada como a proximidade de eleições para que se possa ganhar mais uns votinhos no jogo de poder, né?

No dia seguinte, estrada!

No próximo post vou contar minha experiência de atravessar a ilha, o que vi, por onde andei, mas já adianto que Cuba é verde, posso provar!!


SUGESTÕES DE LIVROS


Passado Perfeito: durante o inverno e seus ventos frios do norte, acompanhamos as investigações do assassinato de um figurão do partido, que havia sido ex-colega de Conde no pré-universitário La Víbora e casado com Tamara, também colega de classe e a paixão da juventude do detetive. Ventos de quaresma : na primavera, os ventos cortantes que prenunciam a temporada de furacões obrigam o detetive a voltar ao colégio La Víbora para desvendar o assassinato de uma professora de Química ao mesmo tempo em que redescobre a paixão na ruiva Karina. Máscaras ocorre no verão em Havana, em agosto, durante a festa religiosa da Transfiguração de Cristo, quando o detetive precisa desvendar a morte de um travesti. Paisagens de Outono é o momento de nos separarmos da sedutora personagem com quem convivemos durante um ano. Na época dos furacões, as mudanças no protagonista vão acontecer, mas ele ainda precisa desvendar um assassinato em que está envolvido um funcionário do governo encarregado de cuidar dos bens expropriados da burguesia. Mario Conde faz 36 anos nesse último livro e decide abandonar a polícia. Leonardo Padura é autor de outros sucessos, como Antes que anoiteça, O homem que amava os cachorros e Hereges.

Trilogia suja de Havana é um marco na literatura latino-americana. Em grande parte autobiográfico, é uma narrativa arrebatadora sobre o cotidiano de Cuba em plena crise econômica e o mais emblemático livro de Pedro Juan Gutiérrez. Sem medo de se expor, o escritor narra sua vida particular e tudo o que se passa ao seu redor. Com uma linguagem direta, aborda temas como sexo, fome, desencanto e luta. São relatos dramáticos, e por vezes cômicos, sempre acompanhados de muito rum e sensualidade. Trilogia suja de Havana é um deslumbrante conjunto de histórias de ritmo acelerado, orquestradas como um romance.Duras,comoventes e verdadeiras, elas nos revelam um escritor único, um cronista implacável em tempos contraditórios, terríveis e fascinantes. ( Cia das Letras)


SUGESTÕES DE FILMES E LINKS INTERESSANTES

1- Fábrica de Arte Cubano ( acaba de ganhar o prêmio Travellers Choice 2020). Deixo aqui o link do Instagram, para que você possa se encantar com essa junção INTERESSANTÍSSIMA de galeria de arte e clube : https://www.instagram.com/p/CEUq8sdCUKG/?igshid=hhn288396xve

2- Fotos do bairro La Víbora bairro onde se localiza o Pré-universitário, cenário dos contos: https://havanatimesenespanol.org/fotorreportajes/la-barriada-habanera-de-la-vibora/

3- Fotos do bairro Mantilla , onde vive o escritor Leonardo Padura : https://havanatimes.org/other-galleries/havanas-mantilla-neighborhood-in-pictures/

5- Documentário sobre o escritor Leonardo Padura e sua vida em Havana, exibido pela RTVE - espanhola : https://gloria.tv/post/TZHoEKYpbXdL23W8K8dRmdWmD?

6- Documentário Cuba e o cameraman, Netflix. Um cinegrafista americano que registrou imagens de Cuba de 1974 a 2016, ano da morte de Fidel.

7- Minissérie As Quatro Estações em Havana. Netflix

8- Filme Últimos dias em Havana, Netflix. Narra o drama de quem decide partir e de quem fica

9- Filme Numa escola em Havana, 2014. Ao narrar as mudanças sofridas pela escola,reproduz as mudanças sociais em Cuba. https://www.youtube.com/watch?v=nq8HJdaBTlw

10- Filme Papa Hemingway. O 1º filme hollywoodiano rodado em Cuba após a revolução.

11- Filme 7 dias em Havana . 7 dias da semana contados por 7 cineastas diferentes. https://www.youtube.com/watch?v=8OPhEaXW6xA




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